Morte ronda Hamlet, incerteza assusta e ossos relativizam valores. A dúvida “ser, ou não, ser” príncipe intui que ações que podem levar ao suicídio são pensamentos valiosos, se tudo terminará no túmulo tudo vale.
Em nosso idioma, uma frase que reflete essa mesma ideia é: ‘Ser ou não ser, essa é a questão’. Na verdade, é assim que a frase de Shakespeare foi traduzida no Brasil. Outras frases que podem nos fazer refletir sobre o nosso ser e existir são: ‘Ser, existir e estar são todos verbos importantes para descrever a vida’. O documento que rege a nossa sociedade, a Constituição, trata do tema.
Impactantes são as frases que nos fazem refletir sobre o seu ser e continuar sendo, como ‘Pensar, logo ser’, que nos faz refletir sobre o processo de pensamento e existência. Outras citações, como ‘Ser ou não ser, que é a questão’, nos fazem questionar sobre o nosso destino e o nosso continuar sendo. Pensar e existir são dois conceitos relacionados que merecem ser explorados.
A Consciência do Príncipe: Uma Reflexão Sobre Ser e Não Ser
O príncipe Hamlet já havia enfrentado diversas situações que o levaram a questionar a morte de seu pai, supostamente assassinada por seu irmão, o traiçoeiro Cláudio. Em um momento de introspecção, ele compartilha seus pensamentos com o rei e o conselheiro Polônio, que desejam entender melhor a mentalidade do príncipe e determinar se ele está de fato louco. Em algumas montagens cinematográficas, Hamlet intui que está sendo ouvido, tornando o monólogo mais um depoimento e acusação. Todas as reflexões do texto giram em torno da dúvida sobre prosseguir ou não nas ações que podem levar a um confronto com um fim incerto. Ele reflete sobre o suicídio, pensar em fazer ou não fazer, ser ou não ser. Existem contradições enormes na fala do príncipe, que menciona nunca ninguém ter voltado da morte, apesar de ter falado com o fantasma do pai que retornou.
Da mesma forma, o príncipe reclama das ações nefastas de quem tem poder; ele é um homem do poder e será capaz de matar seu quase sogro sem remorso pouco depois. E toda a questão envolve se a ação é adequada ou inadequada, se haverá mais consequências negativas ao agir do que efeitos benéficos. O mal é diluído em tudo, é um grão de areia no jogo cósmico. O que fazer? Vamos sair das altas nuvens de Shakespeare e descer a uma cena de verniz de Nelson Rodrigues. Você, por acidente, viu em um restaurante a esposa do seu melhor amigo aos beijos com outro homem. Eles não perceberam sua presença.
Sua mente desenha possibilidades: a) Você conta para o seu amigo, ele pode negar e achar que é calúnia; b) Você conta para o seu amigo, ele crê na narrativa e, apesar de tudo, reconcilia-se com a adúltera, tornando você uma memória incômoda daquela dor; c) Você conta para o seu amigo, ele pode matar a esposa…você ficaria com remorsos por uma morte e uma prisão; d) Você pode ficar em silêncio absoluto, mas a informação vai envenenar a amizade de vocês; e) Você conta para o seu amigo, ele agradece, reforçando a amizade.
Viu? Em 80% das possibilidades, o resultado é negativo para você e para a amizade de ambos. Contar ou não contar, eis a questão! Se o príncipe dinamarquês ficar calado, sem agir, trairá a memória do seu pai. No entanto, Cláudio é bem mais velho, e Gertrudes não pode ter outro filho. Com o tempo, Hamlet será o novo rei da Dinamarca, por pura inércia. O silêncio garante a Coroa; a denúncia arrisca o pescoço. Toda escolha implica renúncia. To be or not to be?
Voltemos à frase. O verbo To Be é um signo aberto, de múltiplas possibilidades. Aqui, implica consciência e liberdade diante do futuro e, segundo Elvio Funck, pode remeter também a ‘existir ou não existir’, ‘continuar a viver ou não continuar a viver’. Ressurge a palavra ‘questão’. O autor Harold Bloom, citando Harry Levin, disse que a palavra é uma verdadeira obsessão na peça, pois ela é empregada nada menos do que dezessete vezes.
A morte ronda o monólogo. Muita vez, usa-se uma caveira na mão de Hamlet durante a cena. A incerteza da morte parece se manifestar em sua mente.
Fonte: @ Estadão
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